Tuesday, July 11, 2006

Bia falcão é o poder


Há uma confusão na hora de sair de casa. Minha mãe está fora e meu pai está prestes a sair comigo e com a Raquel, sempre enrolada como de costume. E eu louco procurando o meu caderno para por na mochila e cato o meu Atlas do Corpo Humano como forma de ilustrar a apresentação sobre digestão que farei no colégio. Luis e o Bispo esperam por mim no colégio e fazem parte do meu grupo. Meu pai disse que mais tarde fará um macarrão. Acho a receita repetitiva mas me agrada a idéia.

Não carrego nenhuma anotação comigo, só abro o livro na página onde há o esquema da epiderme/derme como forma de ilustrar o trabalho. Passar o livro para os demais colegas durante a apresentação.

No esquema da derme uma área dela é descrita assim: “aqui não passam mais formigas, devido aos hábitos de higiene atuais. Todavia o que pode existir são resíduos fecais e micróbios presentes nas unhas que passam por aqui”. Dou uma risada com aquilo e meu pai chama a minha atenção sobre como é importante manter os hábitos higiênicos.

Raquel sai na minha frente cansada de me esperar. Eu ainda enrolado coloco o caderno e o livro na pasta cinza (igual a que eu usava no terceiro ano) e saio de casa vestido com o uniforme do Pedro II com o escudo das três estrelas que indicam eu ser aluno do terceiro ano do ensino médio.

No caminho para sair de casa deparo com um morador antipático do prédio falando alto no celular. Estou decidido a fazer carão e ele faz a mesma coisa. Sigo pelo corredor e ele vem atrás ainda falando alto no celular.

Meu pai me entrega um guarda-chuva grande de cabo marrom e fala que vai chover. Eu estranho pois o dia não me parecia chuvoso, mesmo assim sigo o conselho dele pois ele sabe quando o tempo vai virar e parece que isso vai acontecer no fim do dia.

O tempo está garoando, mas ao passar por baixo da copa das árvores na praça a chuva é mais intensa. Longe eu vejo Raquel pegar o 409 apressada desviando-se da água que os ônibus jogam pelo fato da pista estar alagada. Até tento correr para alcançá-la, mas não consigo. Logo atrás vem um ônibus que eu tento identificar com dificuldade seu número para ver se me serve, pois já são 10 para 8 da manhã. O ônibus é o 183 (Estrada de Ferro – Laranjeiras que não existe) e vejo que ele não me serve. E estranho porque nunca tinha visto ônibus daquele número ali, mas acredito que era uma linha especial que circula durante as manhãs.

Na pista do outro lado um ônibus vem na contramão e um cara de jaleco branco e de óculos grita “CP2! CP2!”. Eu tento alcançá-lo também, mas me parece impossível. Até que alguém no ponto de ônibus assobia e ele recua, parando no sinal já na pista do mesmo lado do ponto. Percebo que são dois alunos do colégio e eu me aproximo cautelosamente para saber se aquele ônibus de fato é o ônibus do colégio. Ao ver o motorista vejo que é o César Maluco, com o uniforme do colégio. Percebo que assim posso pegar o ônibus, mesmo sem graça de ver o césar pois há muito tempo eu não o vejo, ou quando o vejo de vista na rua o evito. E ele me diz, pegando no meu braço: “Há quanto tempo Odilon, você está bonito!”

Dentro do ônibus não há lugares para sentar e me sinto um tanto nervoso por não dar tempo de eu ler o resumo do trabalho. No banco da frente há dois meninos mal vestidos que eu julgo ser pivetes. Embora uma placa na frente do ônibus e uma outra na frente da fábrica indicam que há um bom número de dias não há assaltos por pivetes reincidentes (ou coisa do tipo) ali. Um dos moleques passa a mão por fora da camisa, onde parece esconder uma arma. Penso em descer no mesmo ponto que eles na entrada de Taboão, pois também julgava que o colégio fosse ali. De repente me dou conta de que não sei onde é o colégio. Um passageiro desce e outro fica em pé, como que para descer no próximo ponto. Depois vejo que os meninos estão acompanhados da mãe, parecida com Tia Lucinha e em seguida um dos garotos desce com ela no outro ponto. Só que o garoto em questão já é um adulto agora.

Descubro um lugar vago no ônibus para sentar e pego os meus papéis com as anotações sobre o endereço do colégio. Lá está o endereço certo e me lembro de que o Luis me fala para descer no mesmo ponto da casa dele. O trânsito está um pouco engarrafado mas por alguns instantes. Olho o relógio e vejo que já passa das oito e imagino os meus colegas de grupo preocupados.

Desço no ponto indicado, que é igual ao ponto em que eu descia em Bangu, e sigo andando para descobrir onde é o Wandic (nome do colégio que o Luis estudou). Ainda na rua há um comitê de recepção. Sento em uma carteira e um japonês maluco começa a falar das dificuldades que teremos aquele ano com exercícios difícieis. Fala contas absurdas com números decimais e depois vem com uma charada como:

“Quantas vezes o número 2 aparece entre 1 e 100?”

Sem deixar tempo para responder ele mesmo dá a resposta que é surpreendente apesar de simples, mostrando todos os números entre 1 e 100 em que aparecem ou o 1 ou o 2 ou os dois ao mesmo tempo. Depois o japonês coloca uma forma maluca no quadro com potências como forma de resolver aquele problema, com expoentes negativos e o número imaginário “i” mas completamente fora de contexto. Depois ele autoriza a entrada dos alunos.

Estou sentado na primeira fila e a menina da outra fila levanta e vamos todos em direção à sala de aula. Um aluno passa correndo na minha frente (ele parecia ser o Gianechinni) e logo percebo que há duas salas, uma para meninos e outra para meninas e eu estava quase indo para a das meninas. Fico com vergonha de alguém reparar que estou indo para a sala errada mas isso não acontece.

Ao chegar na sala as carteiras são pequenas e eu sento. Parece que terá aula de inglês. Na sala há meninos e meninas. Tento ver qual a melhor disposição das carteiras, se é sentar em círculos ou em pequenos grupos conforme a orientação da professora. Decido chegar com minha carteira pra mais perto da mesa da professora, que é a cara da Sandra Brea, e digo-lhe que sou aluno novo, de outra cidade, ali e que por isso meu dever não está pronto.

Um rapaz loiro está sentado ao meu lado e atrás de mim uma menina alisa a minha cabeça e meu cabelo raspado a máquina 1. Gosto daquela sensação e acho que o fato da menina me fazer carinho mesmo sem me conhecer era uma diferença dos paulistas em relação aos cariocas.

A TV mostra uma novela e o rapaz loiro comenta algo relativo à beleza de um dos atores e eu concordo com ele. Trocamos rápidos sorrisos discretos como se disséssemos um para o outro que somos do mesmo time.

Do lado de fora da sala está sentada Bia Falcão. Me aproximo dela e digo-lhe uma série de ironias e ela tenta ser irônica da mesma forma. Depois eu falo para ela “A senhora não tem vergonha em ficar perseguindo meu pai, um senhor de 70 anos, nordestino. Justo a senhora que se acha tão chique fica discutindo, batendo boca com ele!”. Ela se faz de vítima dizendo que a briga com o meu pai era invenção dele e aquilo me deixa com mais raiva, pois sei que ela o tentou humilhar. Tiro os óculos dela e quebro, xingo-lhe palavrões e puxo-lhes os poucos cabelos. Eu tiro os óculos mas novos óculos aparecem na cara dela. Isso me irrita e no final eu digo a ela: “Enquanto eu estiver nesse colégio você não terá um minuto de paz, Bia Falcão, porque eu não vou te dar descanso e não temo as suas represálias”. Volto para a sala de aula e tento rebobinar a fita do sonho.Eu estou na carteira no mesmo momento em que a vejo, mas fico na minha só olhando-a com ódio. Depois avanço a fita para o mesmo ponto de antes como forma de não apagar a parte em que eu ameaçava.

* momentos antes de acordar percebo uma espécie de bifurcação no sonho no ponto em que aparece o ônibus. Eu chego no Pedro II e falo para Maria Helena que estou sem o RioCard. E como forma de ter um cartão eu vou pagando a passagem do ônibus que entro com um RioCard comum, não com o de estudantes, mas ninguém repara nisso e eu me sinto bem até que um dia o RioCard de estudantes realmente está em minhas mãos.

Monday, July 10, 2006

Perto de Deus


Chego no alto de um terraço coberto com colunas brancas, estilo grego. Alguém está comigo. Olho para baixo e tenho vontade de pular. Mas fico com medo. O meu "outro eu" diz que não há problema porque ali eu fluturarei. Já estou com o corpo no espaço voando e eu digo "mas comigo eu sempre caio, sempre acontece comigo nos meus sonhos". A paisagem é deslumbrante: um mar muito azul, montanhas grandes cobertas por verde tipicamente da Mata Atlântica. Ao sentir que vou cair meu outro eu me diz: "não há porquê ter medo: essas montanhas, o mar, tudo isso é você mesmo". Ao olhar para baixo vejo meu rosto em várias fotos 3x4 refletido no mar. Aquilo me acalma e sinto que estou subindo cada vez mais e olho em direção ao sol. Sinto que estou cada vez mais perto do paraíso e que se eu chegar lá é sinal de que terei morrido. Por isso, acordei!